segunda-feira, 31 de maio de 2010

Na medida dos pesos


Nas medidas dos pesos, peso o olhar.

Nos pesos das medidas, meço o sorriso.

Troco a nota.

Deixo de medir, deixo de pesar.

Apenas sinto a delícia que é acompanhar.

Escrito em 17/03/2008

[Ao som de Bebel Gilberto, Samba e Amor: http://www.youtube.com/watch?v=BFFkc7LjdYQ]

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Parecem que não querem ser

Tudo parece desencontro. Ou seria azar, inferno astral ou algo das maldosas mandingas? Sei lá. As coisas parecem que não querem ser. E essa maré carrega aflição.
É uma sensação de inadequado e de que o hoje poderia voar para o amanhã para que eu pudesse flertar com a clássica leveza de um domingo ensolarado pela manhã.
Viremos a página.

[Ao som do silêncio]

terça-feira, 18 de maio de 2010

Quando ainda se tem o que falar e o que se perguntar, ainda que seja um “como vai você?”, é melhor que os dois escolham um bom café, uma vista em branco e preto, uma chanson discreta. Resta sentar em cadeiras dispostas por testemunhas para que sejam acompanhados pela boa e velha nicotina dos tempos antigos.

Se a nicotina perdurará por muitos anos ou reviverá em apenas mais uma passada de olhos? A quem importa? O importante é desencontrar, reencontrar e ver que, mesmo que tenham parado de fumar, a nicotina ficou no corpo e nem fez mal à saúde, como diziam todos os outros que não eram aqueles dois.

Escrito em 09/04/2008


[Ao som de So What, Miles Davis e John Coltrane. http://www.youtube.com/watch?v=P4TbrgIdm0E]

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Hoje estou meio.

Hoje.
Estou meio folk.
Meio amarelo-outono.
Chá inglês com chuva no Odeon.

Hoje.
Estou meio ruelas do Centro do Rio de Janeiro.
Meio vento furioso do Arpoador com suas ondas fortes.
Silêncio diurno e gandaia com tormenta nos Arcos da Lapa.

Hoje.
Estou meio cumplicidades.
Meio saudades.
Vontades.



"Eu confesso só me resta a vida inteira.
Só me resta vida em mi maior e lá."

[Ao som de Sweet Jardim, Tiê. http://www.youtube.com/watch?v=QMMljT-nkB0]

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Chapéus há muitos.

Dizem por aí, inclusive, que se relacionam com alguma coisa de hierarquia, condição social ou até mesmo a origem de alguém.

O atual chapeau começou como uma prerrogativa masculina e depois virou uma profusão de coroas pra cá e pra lá, que adornavam as cabeças iluminadas ou não de reis e rainhas. Até hoje a mulherada se emperequeta (?) com uns tipos enormes. Encontro até mesmo um monte de cabecinhas adornadas em rodas de samba da modernidade carioca.

Mas o chapéu dos meus sonhos estava bem distante de tudo isso. Era quase um modelo inglês.

Chapéus há muitos. Porém, ele era um misto de boina com boné, mas mais ajustado na cabeça. Tinha um veludo linear e coloração azul quase verde.

Eu havia experimentado uma centena de chapéus, mas só aquele me agradou. Só aquele me completou. Só aquele me encantou.

Sei lá se comprei, se ganhei ou se roubei.

Eu estava feliz de ter encontrado aquele chapéu, em meio a tantos outros que não se encaixavam. E o Chapeleiro Maluco ficou olhando encantado para o meu encantamento.

Era um sonho? Sei lá. Só sei demorei uma noite inteira para encontrá-lo e, quando vi, estava na minha cabeça. Azul meio verde.

Cadê Freud nessas horas para estudar os meus sonhos? Modéstia à parte, sou um achado para a psicanálise.

Acordo com vontade de encontrar o chapéu, mas sei que ele ficou lá.

Acordo meio Alice. Acordo meio Chapeleiro Maluco. Acordo Meio Maravilha.

Chapéus há muitos. Porém aquele misto de boina com boné, mas mais ajustado na cabeça, com um veludo linear e uma coloração azul quase verde, só tinha aquele. E ficou lá em meio a outros tantos. Era só mais um, mas esse um era só meu. E continua sendo meu até que eu sonhe de novo e volte para buscá-lo. Meio Alice. Meio Chapeleiro Maluco. Meio Maravilha.

[No clima do trailer de Alice, de Tim Burton: http://www.youtube.com/watch?v=DeWsZ2b_pK4&feature=fvw]

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Girassóis

De repente e não mais que de repente, cismei com o amarelo. E, como não podia deixar de ser, com os girassóis. Bateu uma vontade tremenda de fazer girar uma nuvem de letras ao redor de um girassol só para falar nele e lembrar o quanto é bonito e quanto me hipnotiza.

Espanta é o fato de eu nunca ter sido muito apaixonada por qualquer flor. Tudo bem, eu tenho afeto especial por orquídeas que, por acaso, também podem ser amarelas. E esse afeto pelas orquídeas é quase uma herança familiar. Minha avó amava as tais orquídeas e eu cresci com a minha mãe enfeitando a casa com diversos vasos delas. Entrar em um orquidário é quase um lanche da tarde em família. Mas comer flores não me apetece. Deixo para vocês.

Eu podia dizer aqui que os girassóis são plantas originárias da América do Norte e América Central cultivadas pelos povos indígenas para alimentação ou que Francisco Pizarro encontrou dizersos objetos incas e imagens moldadas em ouro que faziam referência aos girassóis, como figura do Deus do Sol, mas, não.

Prefiro ficar com as crendices de que os girassóis representam fama, sorte e felicidade. É mais poético e, sei lá, beira o esotérico.

Dispenso o mito da fama que os tais girassóis trariam porque eu não quero ser alvo de olhares curiosos. Por mais idissincrático que possa ser, quero um girassol discreto. E sempre quis ser. Posso ser mais um girassol no meio de tantos que, muito menos que me importar, eu agradeço.

A sorte, admito, não é muito minha companheira, mas ela toca a campainha em momentos decisivos.

E a felicidade, não sei o que significa, mas sinto. As coisas simples da vida estão ao meu redor, por mais que não sejam simples para todos. E isso me basta. Acho que isso é a tal felicidade. E se não for para os contrariados filósofos, para mim é. E, repito, isso me basta.

Agora só me resta enfeitar toda uma casa com girassóis, nas janelas, nas mesas e nos cantos. Para continuar com a sorte escassa e chamar a felicidade abundante. Também me resta renovar um guarda-roupa com uma série de blusas, calças, vestidos, sapatos e bolsas amarelos, dos mais variados tons, porque dizem que a cor do vestuário traduz o humor do usuário. Até cansar. E ver que outra cor pode representar qualquer coisa que, para mim, vai ter gosto do que eu quiser, mais uma centena de vezes. Com um quê de misticismo ou esoterismo, sei lá.

E isso me faz lembrar as cores do Ano Novo. E isso me faz lembrar as cores de festas de casamento. E isso me faz lembrar as cores de roupinhas de bebês. E isso me faz lembrar as cores do arco-íris. E isso me faz lembrar do branco. O branco que mistura qualquer cor, mas que, por hoje, não bate a minha fascinação pelo amarelo do girassol.


"Não ofereço perigo algum: sou quieto como folha de outono esquecido entre as páginas de um livro, definido e claro como o jarro com a bacia de ágata no canto do quarto - se tomado com cuidado, verto água límpida sobre as mãos para que se possa refrescar o rosto, mas se tocado por dedos bruscos num segundo me estilhaço em poeira dourada. Tenho pensado se não guardarei indisfarçáveis remendos das muitas quedas, dos muitos toques, embora sempre os tenha evitado aprendi que minhas delicadezas nem sempre são suficientes para despertar a suavidade alheia, e mesmo assim insisto - meus gestos e palavras são magrinhos como eu, e tão morenos que, esboçados à sombra, mal se descatam do escuro, quase imperceptível me movo, meus passos são inaudíveis feito pisasse sempre sobre tapetes, impressentido, mãos tão leves que uma carícia minha, se porventura a fizesse, seria mais branda que a brisa da tardezinha."

Caio Fernando Abreu

terça-feira, 4 de maio de 2010

O pé pelas mãos

Sorriso desfigurado Coração descompassado Céu perdeu o azulado Olhou de novo para o passado Meteu o pé pelas mãos E se cansou dos nãos Caminhou mais pesado O passo é arrastado Olhou para todo lado Foi de novo assaltado A fila do emprego Já não é mais para o Diego Resolveu dar uma de encantado E olhou para o cara perfumado De ouro lotado De mulher pra todo lado Conversou Negociou Vendeu Roubou Matou Morreu com 20 anos Deixou mãe com 35 anos Mulher com 15 anos Filho com 2 anos Choraram uns 10 minutos Correram pelos viadutos Começaram vida nova Esqueceram aquela desova Que durou 1 minuto Para aquele mané nada astuto

Escrito em 11/07/2004

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Segundas-feiras


As segundas-feiras são quase poéticas.
Mas até que seriam, se não fosse a burocracia.

As segundas-feiras são um quase início de semana.
Mas até que seriam, se não fosse o domingo.

As segundas-feiras são quase outras segundas-feiras.
Mas até que seriam, se não fosse o jornal.

As segundas-feiras são quase adocicadas por Caio ou embriagadas por Clarice.
Mas até que seriam, se não fosse a terça-feira.

As segundas-feiras são quase.
Mas até que seriam. Inteiras. Se fosse ele aqui.